Fórum Nacional de Educação do Campo (Fonec) ressalta importância de filósofo na construção da pedagogia crítica, com foco na transformação social | Por Raquel Martins Ribeiro
O mês de setembro tem sido marcado por homenagens ao centenário de um dos mais notáveis nomes da pedagogia mundial: Paulo Freire. Pernambucano nascido na Recife da década de 1920, o filósofo elaborou um projeto de educação popular crítico, na qual professores, alunos e sociedade são agentes do conhecimento.
Mesmo 24 anos após sua morte, as sementes freireanas continuam a se espalhar por diversos países. Ainda hoje, o Patrono da Educação Brasileira está entre os três autores mais citados em trabalhos acadêmicos das áreas de humanas. O escritor detém também 29 títulos de Doutor Honoris Causa por universidades da Europa e da América, e centenas de outras menções e prêmios.
Para Salomão Hage, membro do Grupo de Estudo e Pesquisa em Educação do Campo, da Universidade Federal do Pará, a crescente publicação de suas obras, em dezenas de idiomas e centros de pesquisa, são indicações da vitalidade do seu pensamento. “Isso anima os inúmeros e variados coletivos e movimentos de diferentes setores da sociedade civil brasileira, latino americana e mundial a permanecerem em luta”, salienta, e completa: “Paulo Freire dedicou grande parte de sua vida à alfabetização de adultos e à educação da população pobre, excluída, oprimida, marginalizada, subalternizada. E com eles e elas, em comunhão, vivenciou experiências de educação dialógica, humanizadora, libertadora que valoriza as diferenças”.
Justiça Social
Uma das frases mais célebres de Paulo Freire, “a leitura de mundo precede a leitura da palavra”, do livro A Importância do Ato de Ler (1988), reflete bem os ideais de emancipação, cidadania e justiça social defendidos pelo autor e representam, na atualidade, a resistência política empreendida pelos povos que trabalham e lutam pela terra, como quilombolas, ribeirinhos, povos da floresta, indígenas, camponeses e sem-terra, dentre outros.
Integrante do Coletivo Nacional de Educação do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), Rubneuza Leandro de Souza acredita que o diálogo provocador sugerido por Freire permanece vivo na maneira como professores e professoras do campo vem construindo uma identidade educacional popular. “Eles se colocam sempre do lado das causas dos movimentos sociais”, completa.
A professora da Universidade de Brasília Eliene Novaes também considera que o pensamento freireano de compreensão da realidade da condição de oprimido, na qual muitos trabalhadores do campo se encontram, é um elemento essencial para que eles possam ter consciência da sua condição de classe e, a partir dessa consciência, possam atuar na construção coletiva de saídas e possibilidades de transformação social.
“O grande desafio que está posto, a partir do legado de Paulo Freire, é a gente construir processos educativos que permitam que as pessoas tenham consciência da sua condição e que isso as impulsione para lutar, para se organizar e atuar no seu território”
explica Eliene Novaes
Resistência
Autor de “Pedagogia do Oprimido”, obra literária que está entre os 100 livros mais pedidos em universidades de língua inglesa pelo mundo, Paulo Freire foi eleito pelo governo federal e apoiadores do bolsonarismo como inimigo prioritário do campo ideológico e educacional.
“O professor representa a superação de tudo que esse governo e a burguesia desse país defendem. Lucro acima de tudo e de todos, exploração e precarização da força de trabalho. Portanto, defender Paulo Freire é defender uma teoria da educação que se colocada na condição de ajudar a formar uma consciência de classe, contribuirá para fazer as transformações necessárias que nosso país precisa. Só um povo consciente e organizado pode fazer essas transformações”, afirma Rubneuza..
“Nós agricultoras e agricultores familiares do sistema Confederativo CONTAG, primamos pela liberdade, autonomia e emancipação dos sujeitos no processo de ensino-aprendizagem, compreendendo que não há verdades absolutas, mas sim saberes diferentes que devem ser dialogados”, conclui Edjane Rodrigues Silva, secretária de políticas sociais da Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares.